quarta-feira, 4 de julho de 2012

O susto


Ainda que Cicília fizesse de tudo para me incluir nas escolhas que diziam respeito ao nosso futuro filho, o sentimento de paternidade era um pouco vago. É que é difícil amar alguém que você nem conhece.

Mas o sentimento estava ali. E ia crescendo pouco a pouco.

De qualquer forma, sabia que, dentro da barriga dela, ele estava seguro (pelo menos era o que os médicos diziam), portanto, a preocupação era com o bem-estar dela. E devo confessar uma coisa: não existe nada mais estressante nessa vida do que ter uma mulher grávida a partir dos 7 meses.

A barriga já não é mais um complemento no corpo dela. Incomoda. Nessa fase, existe dificuldade para andar, sentar, levantar, deitar, enfim, tudo. Com o acréscimo de um pequeno detalhe: ela se transforma em uma bomba relógio que a qualquer momento pode estourar.

Traduzindo: meu celular não podia tocar que entrava em desespero na expectativa de ouvir um “corre que a bolsa estourou”. E passei por um susto.

Na época, eu freqüentava academia e por volta das 19h lá estava eu em cima da esteira. Depois de derramar litros de suor e tentar destruir meus músculos naquelas máquinas, voltei para o carro. Haviam 17 chamadas de Cicília.

Retornei a ligação já com o carro em movimento. “Oi, o que aconteceu?”, perguntei, já preocupado. “A bolsa estourou, liguei para você e como você não atendeu, chamei Painho. Ele me pegou e estamos a caminho da Unimed. Vá em casa se arrumar e me encontre no hospital”

Acelerei. A cabeça começou a dar voltas: meu filho vai nascer. Arthur vai nascer. Tenho que correr. Antes do previsto. Será que está tudo bem? Como será que ele é?  Nem vai ser de fevereiro como eu e Cicília. Existe chance de ter olhos claros. Será que vai ter?

Se tinha algum carro na BR, não vi. A academia ficava a cerca de cinco minutos de casa. Entrei na garagem com o carro cantando os quatro pneus. Por pouco não acertei uma das pilastras. Travei as portas e subi em disparada. Abri a porta de casa, já atirando a roupa para todo lado. Corri para o quarto. Quando abro a porta... Cicília estava deitada fazendo bordado e com Arthur dentro da barriga. Olhou para mim e disse:

“Se fosse verdade? Como é que seria? Dezessete chamadas no seu celular e você não atende? Eu posso ter o menino a qualquer momento!”

Eu poderia dizer que levei na esportiva. Não, não levei. O ódio invadiu minha alma. A vontade de explodir tomou conta de mim. Usei todo o auto-controle que possuía, voltei para a sala, liguei o Play2 e sentei no sofá. Somente depois de dez partidas de PES consegui pensar em algo que não envolvesse quebrar objetos.

Aos poucos a raiva foi passando. E só então a lição foi gravada no meu cérebro: amarre o celular no pescoço e atenda no primeiro toque. Afinal de contas, era verdade: Arthur poderia nascer a qualquer momento.

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