quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Uma menina


Já tínhamos o exemplo de que as tais simpatias não eram nem um pouco confiáveis (clique aqui), portanto, aguardamos ansiosos a ultrassom que iria nos dizer qual o sexo do bebê.

Quando soube que Cicília estava grávida, liguei para Mainha para dar a notícia de que ela seria vovó novamente. E ela de cara cravou: “vai ser uma menina! Vou comprar o carro rosa da Penélope Charmosa”.

O tempo passou e devo dizer que ela não chegou a saber se acertou ou não. Ou melhor, soube. Mas não entre nós. É que algum tempo depois desta conversa ela precisou fazer aquela viagem sem volta que todos estamos destinados a fazer. Como diz Ariano Suassuna em O Auto da Compadecida:

“Encontrou-se com o único mal irremediável. Aquele fato sem explicação, que une tudo que é vivo em um só rebanho de condenados. Porque tudo que é vivo, morre”.

E numa das ultrassons as chances de acerto dela caíram consideravelmente. Dr. Eduardo, da Nova Imagem (que não coloco mais os pés lá e prometo dizer porquê) olhou, procurou e disse: “Tem 70% de chance de ser um menino”.

Suspendemos a escolha de nomes femininos e focamos nos masculinos. Otávio, Davi, Pedro, Augusto e mais uma ruma de nome que a gente ia falando e não chegava a um acordo.

Porém, no dia seguinte tudo mudou. Cicília estava de plantão e resolveu fazer uma nova ultrassom com um médico lá que é conhecido por não errar uma. E esse afirmou sem medo: “Compre tinta rosa, com toda a certeza é uma menina”.

Perfeito. O sonho de todo casal que pensa em ter apenas dois filhos. Um menino e uma menina. E foi um tal de escolher nome, olhar roupas de meninas, pensar nas bonecas.

E Mainha, onde quer que estivesse, deve ter sorrido. Feliz, por saber que teria uma neta. 

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Os chutes


Quando se descobre que vai ganhar o primeiro filho, não importa se vai ser menino ou menina. Não há escolha. “É o primeiro, então o que vier está bom”. Ok, tenho que admitir: não há escolha em hipótese alguma. Não é a gente que decide mesmo...

Mas como já tínhamos Arthur, uma mocinha não seria má idéia. A história de formar um casal e tudo mais. E desde o primeiro dia iniciei um exercício mental de como seria ser pai de novo. Sempre pensando: como será a relação desse futuro ser com Arthur?

Ora imaginava uma menina e suas barbies, os preços das barbies, vestidos, laços. Uma princesinha que precisaria ser protegida. Em outros momentos, como seria um outro menino. O reaproveitamento dos brinquedos, das roupas.

E a família, claro, não poderia perder tempo e começaram os chutes. Tesoura aberta, fechada, data da menstruação somado com o tempo de sobrevivência do óvulo + tempo de vida de um espermatozóide (de onde o povo tira isso hein?).

E assim como na gravidez de Arthur, destaque para Goretti, amiga de Tia Tita. Refez os cálculos. Havia errado o de Arthur. Tensão no ar. Ultima menstruação, mês em que ocorreu a gravidez, somado à fase da lua, mais a distância da Terra em relação a Vênus dividido pela flexibilidade do balanço do rabo da lagartixa. De novo, complicado.

Parou, olhou para o horizonte e afirmou: “vai ser uma menina, pode comprar a tinta rosa”.

Mainha foi outra que tentou acertar. Jogou o dominó, leu os que os números diziam e mandou: “menina”.

Só nos restava esperar.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

A descoberta - Parte 2


Arthur veio mais ou menos por acaso. Pensávamos em ter um filho, mas ainda não. Achávamos que era cedo, que deveríamos aguardar mais um pouco e, por um acidente, engravidamos.

Bem, Luedva tem uma teoria diferente com relação a isso. Ao saber que Cicília estava grávida, lembro que ela perguntou: “Usaram camisinha? Anticoncepcional? E COMO É QUE NÃO QUERIAM?”. Ok, tem razão. Mas a segunda gravidez foi diferente.

Desde que nos casamos, a ideia era ter dois filhos com uma diferença de, no máximo, dois anos entre eles. Aquela história de um trabalho só.  De preferência, que nascessem no mesmo mês. Já que tínhamos acertado com Arthur, queríamos repetir a dose. Portanto, fecundação em maio para nascimento em fevereiro. O mês da família.

Coincidentemente, nossas férias caíram em maio. E em Junho, Cicília voltou a sentir os sintomas clássicos de uma gestação: peito inchado, corpo cansado e sono em excesso (só faltou enjôo).

Estava no trabalho, quando o telefone tocou. “Alô”. “Oi, sou eu. Fiz um teste aqui de farmácia” (ela trabalha na Maternidade Frei Damião). “Sei, e aí?”. “Tô mei grávida”.

É incrível como certos acontecimentos não lhe deixam acostumado. Pode se repetir várias vezes e a sensação vai ser a mesma. Pai pela primeira vez, poderia dizer que já sabia o que fazer e como seriam os próximos meses com um segundo filho. Mentira.

O mundo parecia ter ficado em suspensão. Tudo estava parado. O tempo, as pessoas, a vida. E após alguns segundos, o turbilhão de pensamentos.

E agora, como vai ser? Dois filhos! Arthur vai gostar de um irmão (ou irmã)? Ele vai preferir o quê? Menino ou menina? E agora, como vai ser?  Vamos dar conta? Pelo menos não vai precisar comprar berço. Se for menino, a gente passa tudo de Arthur pra ele? Se for menina, a gente pinta de rosa? E agora, como vai ser?

Aos poucos, as dúvidas foram se transformando em uma única certeza: mais uma vez, a partir daquele momento, tudo seria diferente.

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

O ônibus

Pense em um lugar frio. 9 graus ao meio dia. Tempo nublado com uma garoa insistente que deixava os ossos congelados. Roupa por todo o corpo. Tôca e luvas. Cachecol. Casaco. É o que uma pessoa normal usa. Eu e Cicília estávamos usando. Mas parecia que Arthur achava que frio era para os fracos.

Usava casaco na marra, sem nada na cabeça e sem luvas. Achando-se o próprio morador do Sul do país. Tudo bem que aparência tinha. Cabelos loiros, pele clara, olhos azuis. Até hoje não entendo como ele não sentia frio. Eu congelava só em olhar para o termômetro.

Mas, de novo, Arthur dificultou o passeio por conta do intestino um tanto desregulado. E tive que mostrar minhas habilidades para trocar fralda em mais um lugar inadequado: dentro do ônibus.

Quando dei início à atividade, percebi que as pessoas mais próximas sorriam e achavam bonitinho um pai ajudar no trabalho de limpeza da cria. Segui trabalhando.

No avião já tinha sido complicado por conta do espaço pequeno, mas dentro de um ônibus em movimento é muito pior. Sem estabilidade, eu tentava me segurar com as pernas nos bancos. Ao mesmo tempo ia tirando a fralda, vendo o tamanho do estrago e tentando imaginar o que fazer com o odor que ia tomando conta do coletivo.

Depois de uns bons solavancos e momentos de agonia, consegui trocar tudo. E, de novo, só então me toquei do que havia à nossa volta. O vazio. De repente, percebi que as cadeiras ao nosso redor estavam vagas e o fundo do ônibus parecia exercer algum tipo de atração sobre os outros passageiros.